A travessia entre o deserto do Atacama e o Salar de Uyuni não é para qualquer um

Entre San Pedro do Atacama no Chile e a cidade de Uyuni na Bolívia estão alguns dos ecossistemas mais singulares e incrivelmente belos que como turista pude testemunhar. Não é à toa que a travessia da Cordilheira dos Andes de uma cidade à outra é uma das aventuras mais procuradas para quem vai a uma dessas regiões. Mas a travessia entre o deserto do Atacama e o deserto de sal de Uyuni não é para qualquer um.

Muito embora popular, a verdade é que o circuito reúne algumas condições extremas e nada ideais de temperatura e pressão. Além de infraestrutura precária, até mesmo para os poucos povos que sobrevivem nas montanhas.

Algumas dessas condições estão totalmente fora do nosso controle, enquanto outras nem tanto.

Durante a travessia de ida e volta, tendo como base o Atacama, sabia que durante quatro dias meu corpo iria experimentar condições até então inéditas, e ameaçadoras. Encarar um período em altitude acima de 3500 metros não é para qualquer um, principalmente para quem vive próximo ao nível do mar. E reconhecer isso como um desafio, é o primeiro passo para um passeio bem-sucedido.

Aclimatar é preciso, já dirá qualquer montanhista experiente. Imagine que você irá permanecer por 3 a 4 dias em altitude oscilando de 3600 a 4200, e que em algum momento irá passar próximo dos 5000 metros. Não fosse a latitude, estaríamos bem próximos do acampamento base utilizado pelos alpinistas que escalam o Monte Everest.

A Cordilheira dos Andes por ali é extremamente árida e a umidade do ar próxima a 0. O deserto do Atacama é o lugar mais seco do planeta. Suba as montanhas, ainda que não literalmente – já que estarás a maior parte do tempo sentado em um jeep -, e sentirás o efeito da pressão reduzida, do ar rarefeito e das temperaturas extremas que te levam de uma tarde de 30ºC à uma noite de -10ºC, em pleno verão.

 

Para seguir o passeio, é preciso estar preparado. Camadas de roupas capazes de proteger contra o frio e o vento, que em algumas localidades sopra em rajadas uivantes. Óculos, chapéus e lenços que protejam também o rosto e que nos permitam abrir os olhos para ver a paisagem incrível – que para muitos, poderá ser uma das mais lindas que irá ver em uma vida. Remédios, hidratantes e água, muita água! Outro desafio para quem mal toma uma copo por dia.

Sob condições extremas de temperatura, umidade e pressão nosso corpo logo sente os efeitos de um ambiente que não foi feito para a gente. O tempo seco e a baixa umidade do ar provocam desidratação grave, ressecamento da pele, da boca e dos olhos, que também ficam irritados. Nossos lábios racham mesmo usando de hora em hora um hidratante labial; os olhos coçam e as narinas congestionam, quando não sangram. Mas talvez o que mais chame a atenção – para o despreparo físico da maioria de nós – é o cansaço a qualquer movimento, a falta de ar, a sonolência, os enjoos e a dores de cabeça. São os efeitos da altitude. E eu os senti, quase todos.

Especialistas dizem que o corpo humano começa a sofrer os efeitos da altitude já aos 2500 metros. Imagine então quando você se aproximar dos 5000m? Dizem também que, para muitos, uma aclimatação adequada deve levar ao menos duas semanas para o corpo se acostumar e se adaptar.

Não dá para saber se você vai ou não sofrer com o mal da montanha, ou soroche, mas sem dúvida para encarar a travessia o melhor é estar em boas condições de saúde e com exames em dia. Durante o trajeto não há posto de saúde, ou seja, não há resgate que leve menos que algumas longas horas. Tão importante quanto, é estar com medicamentos para tudo o que possa ocorrer em sua mochila.

E mesmo que você não sinta nadica de nada com a altitude e com aridez, ainda assim, a travessia não é para qualquer um.

No meu grupo de quatro amigos, dois de nós, eu inclusive, sofremos bastante com diferentes sintomas na primeira noite mesmo tendo supostamente aclimatado por 4 dias. Coincidência ou não, nosso condicionamento físico é péssimo. Mas mesmo os que não padeceram com o mal da montanha acordaram por três noites com rostos inchados e tiveram algum grau de dor de cabeça. Daquelas bem chatinhas de passar com medicação regular.

Pegar leve nas caminhadas (trekkings) previstos no roteiro é primordial se a sua rotina for daquelas sedentárias, como a minha. Uma caminhada leve até a beira do lago logo acelera o coração e demanda um ar que parece que não encontramos na respiração. Pelo menos, não da forma que sentimos que precisamos.

Mesmo se sentindo capaz de correr uma maratona nos andes, é preciso saber que nessa travessia não há conforto. Serão longas horas em um carro, refeições bem simples e banheiros bastante tensos. A infraestrutura boliviana é péssima. Bom para quem está acostumado aos banheiros químicos dos eventos brasileiros ou para quem curte uma pegada mais natural: o bom e velho montinho refrescado pelo vento da natureza. Meus caros, esses momentos serão inevitáveis.

Para garantir uma experiência mais confortável, com direito à cama e banho quentinhos após o jantar, é preciso desembolsar cerca de 3x mais para se hospedar em hotéis 3 estrelas dispersos no paraíso inóspito que são os andes bolivianos. Energia elétrica, água e wi fi – necessidades básicas e essenciais da vida moderna – estarão garantidos, já que ficar sem isso por uns dias não é para qualquer um.

 

 

 

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